A ética em Immanuel Kant e Friedrich Nietzsche

Kant e Nietzsche







Por Vânderson Domingues*

No campo da ética, Immanuel Kant e Friedrich Nietzsche estão entre os mais marcantes filósofos da história moderna e contemporânea. Apesar disto, os dois têm modos muito diferentes de pensar tal questão. Para Kant, a ética se baliza na razão, enquanto que para Nietzsche, na vontade.

 

IMMANUEL KANT 

 

Immanuel Kant, (1724-1804) nasceu no Reino da Prússia em uma família protestante e se tornou professor universitário de física, antropologia, geografia, lógica e metafísica. 

 

O seu projeto de ética começa levantando questionamentos tais como “Por que isto é bem?”, “Por que o bom é bom?”, “Devemos sempre fazer o bem?” e “Conseguimos sempre fazer o bem?”. Para responder a estas e a outras questões recorreu a possíveis fundamentos como Deus, tradição e a razão, desdobrando em duas formas distintas de abordar a moral que seriam “conhecer” e “pensar”. Para Kant não seria possível, por exemplo, “conhecer” Deus, mas sim “pensar” Deus.  

 

Esta discriminação entre o “conhecer” e o “pensar” levou o filósofo a elaborar uma razão prática. Nesse sentido, Kant forjou um modelo com um fundamento universalista. Em outras palavras, Kant buscou desenvolver uma abordagem transcendental que pudesse se manter inexorável às variáveis humanas como o tempo e o espaço. Isto o levou, por fim, a um de seus principais conceitos, o imperativo categórico e a máxima “Age de tal maneira que o motivo da tua ação possa ser universal” (MARCONATTO, 2020).

 

FRIEDRICH NIETZSCHE

 

Friedrich Nietzsche (1844-1900) nasceu na Prússia (atual Alemanha) em uma família luterana e se tornou professor de filologia (estudo da linguagem em fontes históricas escritas, incluindo literatura, história e linguística).

 

O trabalho do fundamento moral é central para o projeto filosófico de Nietzsche. Diferentemente de Kant, suas questões são outras, como “O que é o bem?”, “O que é o mal?” e “Para que o bem e o mal existem?”. Assim, o filósofo se coloca a investigar como nasceram as ideias de bem e de mal e conclui que estas advém de uma “vontade de ordem diante do caos que é a vida” (DIAS, 2020).

 

Um exemplo esclarecedor sobre a moral particular em Nietzsche, talvez esteja na história narrada pelo filósofo em seu livro Genealogia da Moral. A narrativa discorre sobre aves de rapina e ovelhas que estão em situações opostas em relação à potência e à própria vida. Do ponto de vista das ovelhas (de baixo para cima) as aves que as caçam são más, pois as matam. Através de uma condenação moral ressentida, as ovelhas julgam as aves e se percebem como boas valorando como positiva a própria fraqueza. Entretanto, as aves (olhando de cima para baixo) amam as ovelhas por elas serem seu mantimento e, além disso, não percebem a si mesmas e nem as ovelhas como boas ou más. Em outras palavras, da perspectiva das aves de rapina não há motivo para este tipo de julgamento moral já que estas estariam simplesmente “afirmando a vida, exercendo sua potência” (DIAS, 2020).

 

A partir disto, Nietzsche propõe uma ética que afirma a vida através da transvaloração dos valores e que nos levaria para além de bem e mal. Nesta ética não há espaço para uma ordem pré-estabelecida e universal, mas sim para cada caso em particular, tendo em vista que o mundo para o filósofo é constituído “por forças imensas, incomensuráveis, que se chocam continuamente” (DIAS, 2020).

 

DIFERENÇAS

 

Como dito, a forma de Nietzsche elaborar a questão da ética é muito distinta da de Kant, chegando a ser diametralmente oposta. Pela ótica da filosofia do próprio Nietzsche - que se utiliza dos deuses gregos Apolo e Dionísio como contrapartes da ordem e do caos, respectivamente -, a filosofia de Kant teria um domínio apolíneo majoritário, enquanto, a filosofia do Nietzsche, uma inclinação dionisíaca. 

 

Ainda seguindo por essa perspectiva, Kant, teria, segundo Nietzsche, cometido o equívoco de assumir a priori o símbolo Apolo como sendo um valor positivo e, por conseguinte, atribuído o mal a Dionísio. Desta forma, Kant teria submetido o seu trabalho – e a formulação do imperativo categórico – à razão em busca de uma Verdade universal.

 

Porém, Nietzsche advoga uma cosmologia imanente em que o mundo não é formado por essências universais em expressões diversas, mas de modo muito mais caótico, com o sucessivo “encontro conflituoso de forças múltiplas, antagônicas ou convergentes, que se enfrentam furiosamente em busca de efetivação e ampliação” (DIAS, 2020).

 

Portanto, para contrapor esta razão transcendente e universal em Kant, Nietzsche defende o particular em uma vontade de potência imanente, onde a própria vida seria esta vontade que se afirma, se amplia e se torna mais forte. Em suma, em vez de uma vontade de ordem que se submete a regras na tentativa de escapar do caos do mundo, o filósofo afirma uma vontade oposta, a de viver plenamente e com a aceitação irrestrita da vida, mesmo em seus aspectos mais difíceis. 


*Vânderson Domingues é orientador filosófico, escritor, compositor e poeta. Graduado em Filosofia e pós-graduado em Clínica Existencialista Sartriana.


REFERÊNCIAS:

 

DIAS, Thiago. Ética. [S. l.], 2020, p. 18, 20, 22. Disponível em: http://digital.unisa.br/pluginfile.php/906539/mod_resource/content/0/0.MA.Elemento%20Textual%20-%20%C3%89tica.pdf. Acesso em: 21 maio 2020.

 

MARCONATTO , Arildo Luiz. Immanuel Kant (1724 - 1804). [S. l.], 2020. Disponível em: http://www.filosofia.com.br/historia_show.php?id=102. Acesso em: 19 maio 2020.

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