Por Vânderson Domingues
Essa semana estava lendo e refletindo sobre um assunto de nosso tempo, o avanço das neurotecnologias e suas implicações. É claro que a discussão transversal desse tema não se esgota em algumas poucas linhas, nem em um único diálogo e ou postagem de redes sociais, mas resolvi pautar alguns tópicos, apenas para que possamos refletir sobre o assunto.
Como o assunto é questionável de várias formas diferentes, vou levantar apenas quatro reflexões:
1
- O modus
operandi do
antropocentrismo, para variar, não leva em conta os direitos dos
animais não-humanos no desenvolvimento tecnológico:
"O Neuralink está funcionando bem em macacos e, na verdade, estamos fazendo muitos testes e apenas confirmando que é muito seguro e confiável." (Elon Musk)
Por que, em pleno século XXI, a ciência ainda acha razoável fazer "testes" (torturas sistemáticas) em animais não-humanos em suposto benefício dos seres humanos?;
2
- As neurotecnologias se apresentam geralmente como qualidade de vida
(e esperança) para convencer a opinião pública - sem passar por um
debate amplo e supervisão das democracias sobre os usos e objetivos.
No caso, o Neuralink quer utilizar tetraplégicos (humanos) como
"cobaias" na próxima fase de testes para desenvolver um
projeto muito mais ambicioso (problemático e complexo) do que ajudar
pessoas com "lesões graves na medula espinhal". Não se
trata de ignorar o sofrimento de pessoas com lesão na medula - os
avanços tecnológicos são muito bem-vindos nesse sentido -, mas de
se perceber que o projeto visa outro objetivo. O que está em jogo
aqui é realmente melhorar a vida das pessoas ou, principalmente, uma
nova fase de aprofundamento do controle dos corpos/desejos no
neoliberalismo?;
3
- O paradigma cientificista-reducionista duplamente equivocado de que
"somos o cérebro" e de que resolveremos todos os nossos
problemas com tecnologia (a neurociência é a bola da vez). Este
modelo gera soluções ou vidas "esquartejadas" da
totalidade existencial?;
4
- O que se vislumbra no horizonte do Neuralink, do Metaverso e afins,
é, entre outras coisas, um mundo transhumanista (onde se transforma
a condição humana com o uso da ciência emergente). Por hora, esta
proposta se apresenta a serviço da sociedade do rendimento - no
intuito de nos tornarmos "nossa melhor versão" forjados
pelo progresso da neurotecnologia. Porém, no futuro, com alguns
poucos multibilionários controlando profundamente corpos e desejos
em escala global, o que nos espera?
(09/12/21)
*Sobre
a notícia de implante de chipscerebrais.